domingo, 31 de maio de 2009

Meus versos alheios


Fragmentos de Metal contra as nuvens (R.M.J.)

[...]

É a verdade o que assombra
O descaso que condena,
A estupidez, o que destrói

Eu vejo tudo que se foi
E o que não existe mais
Tenho os sentidos já dormentes,
O corpo quer, a alma entende.

Esta é a terra-de-ninguém
Sei que devo resistir
Eu quero a espada em minhas mãos.

Eu sou metal, raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal, eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal, me sabe o sopro do dragão.

Não me entrego sem lutar
Tenho, ainda, coração
Não aprendi a me render
Que caia o inimigo então.

Tudo passa. Tudo passará...

...

pontos finais... ou novos começos


Logo eu que não entendia o mundo, comecei a sondar seus segredos insondáveis quando meus olhos viram o enredo da história. Não história separadas como em uma biblioteca de livros egoístas que falam cada um de si, implorando por clemência para que suas verdades medíocres se façam conhecidas. Já fui um livro egoísta. Egoísta e incoerente. Não pela falta de coesão nem por todos esses problemas gramaticais, mas por não reconhecer que são esses os volumes que usam, na falta de conserto, em mesas balançantes. Livros egoístas que não têm histórias completas. Suas páginas estão lá. Todas elas. Mas o que são se outras páginas não contam sua história? Livros altruístas são lidos. Emprestados, não daqueles na estante, completamente empoeirados, pelas traças devorados. Bons livros não tem um mundo próprio, como contos irreais em que heróis e princesas são tão imaginários quanto suas verdades gritando para que sejam ouvidas, mas que aos ouvidos de leitores sensatos não passam de mentiras ruidosas, sem sentido. Livros, livres, enfim, são os que se libertam por se reconhecer além da individualidade vulgar e encontrar em seus pares a continuação de sua história.


"Quando me vi
Tendo de viver
Comigo apenas
E com o mundo.
Você me veio
como um sonho bom.
E me assustei
Não sou perfeito.

Eu não esqueço
A riqueza que nós temos.
Ninguém consegue perceber.
E de pensar nisso tudo
Eu, homem feito,
Tive medo
E não consegui dormir.
(Teatro dos Vampiros - R.M.J.)

Pra saber que ela é sua


Sempre pintei dias perfeitos
com as cores claras,
com presentes inusitados
de um destino altruísta.
Pensei dias felizes, completos.
Amores exatos,
pelo próprio tempo inalcançáveis.
Dias sem dores,
cheios de flores
de perfumes, sabores

Quem dera soubesse,
na minha vã inocência,
deste mundo a demência
em derrubar o planos,
mesmo que insanos
de quem sonha com a vida.
Deixei de ser o que era.
Não me perdi, confesso,
na cegueira do pessimismo,
ou na prisão do egoísmo.
O mundo é o mesmo.
A moldura é a mesma,
mudou a pintura.
Continua bela,
mas agora revela,
em traços finos, acidentais,
sentimentos tristes,
que de tão inesperados
nem parecem reais.

Mas é pequena, te digo
essa realidade voraz
de esperas que não acabam,
de dores que desabam
quando tudo o que resta
parece cinza demais.
Pouco se nota
desse vermelho de dor
que tomou conta sem pena
do que era rosa no amor.

Mas não julgues saber,
prezado leitor
de tudo o que leste,
o que o autor quis dizer.
Não houve mentiras, prometo.
Somente as verdades.
Verdades que pintei
Na alvura da tela
com essa tinta aquarela
de quem vê o que é belo
onde não existe beleza.
De quem tem a certeza
de que agora a cor
que se apaga com o tempo
sobrevive ao momento.
Muito mais que essa flor,
que na verdade pintei,
por não saber do amor.

Perdi, enfim,
meus desenhos de criança
e o mundo idílico
em que outrora vivera.
Mas ganhei a esperança
de que os quadros reais,
permaneçam por mais
na passageira lembrança
de humanos mortais.

Meus versos alheios

Canção da américa (Milton Nascimento)

Amigo é coisa pra se guardar debaixo de sete chaves
Dentro do coração
Assim falava a canção que na América ouvi.
Mas quem cantava chorou ao ver o seu amigo partir
Mas quem ficou, no pensamento voou
com o seu canto que o outro lembrou
E quem voou, no pensamento ficou,
com a lembrança que o outro cantou
Amigo é coisa pra se guardar
do lado esquerdo do peito
Mesmo que o tempo e a distância digam não
Mesmo esquecendo a canção.
O que importa é ouvir a voz que vem do coração.
Pois seja o que vier
Venha o que vier

Qualquer dia, amigo, eu volto a te encontrar
Qualquer dia, amigo, a gente vai se encontrar.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Obrigado,

São quase 100 acessos em 5 dias de existência.
Você me motivam a continuar escrevendo minhas bobagens.

Daniel (prometo que logo encontro o pseudônimo que pediram)

Você acredita em Deus?


Tenho certeza que muita gente vai torcer o nariz com o texto de hoje. Algumas pessoas têm me perguntado em que creio. Estranhei na primeira vez em que uma delas mostrou um pouco de desapontamento dizendo: "O que?! Você não é ateu? Você escreve um blog intelectual, todo instrospectivo e acredita em Deus?" Achei engraçado o "blog intelectual", mas não, não sou nem intelectual muito menos ateu.

Mas, enfim, façamos de conta que essa humilde coluna fosse um blog intelectual. Agora, quem foi que inventou essa estupidez de que Deus não combina com intelecto, com raciocínio, com inteligência. Claro está, não nego, que a religião cega imbeciliza o ser humano e, se acredito em Deus, acredito que a vontade dele deve passar longe desse tipo de crença irracional. Mas, do outro lado da moeda, a opção em um ateísmo cego parece ser tão irracional quanto a primeira. Incluo aqui o ateísmo por modismo (Richard Dawkins, Daniel Dennet e seus seguidores que o digam), o ateísmo intelectualóide (esse particularmente é o que mais me irrita) e, finalmente, o ateísmo fundamentalista. Todos três "pecam", que irônico, em seus fundamentos.

Os que seguem o primeiro o fazem por falta de leitura, de conhecimento de mundo, por ignorância, enfim. Os do segundo tipo são reconhecidos pelas besteiras que fazem relacionando, por exemplo, teísmo com a religião deturpada da Idade Média. Tentam mostrar que têm um conhecimento profundo do que estão falando, mas são excessivamente superficiais em seus convenções. Por último, aqueles fundamentalistas são os religiosos do ateísmo, que querem a todo custo convencê-lo a também ser um ateu.

Todos os três tipos participam do problema que, particularmente, penso ser o mais grave do ateísmo: a contradição da fé ateísta. Criticam com veemência o argumento da crença em Deus, pela fé, (sim nós cremos pela fé), mas afirmam com a mesma certeza que Deus não existe. (Sim, ateísmo é a negação determinista de Deus). Exercem, portanto, a fé na não-existência de Deus, lançando mão de uma premissa teísta para provar... o ateísmo. É isso que me faz criticar tanto o essa forma de pensamento e admirar, por outro lado, o agnosticismo. Agnósticos, embora não acreditem em Deus pela fé, jamais negarão a sua existência. Por quê? Porque ela não pode ser provada experimentalmente*, tanto quanto sua não-existência.

Por fim, creio porque é a minha crença a fonte da esperança que tenho de que a humanidade não se resuma a essa animalidade instintiva e inescrupulosa que leva-nos constatemente à beira do caos.

*A questão da prova é ainda mais complexa. A metafísica deve se submeter aos critérios empíricos da ciência? Assunto para outra ocasião.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Que país é este?


Acabei de reassistir a uma entrevista do Zeca Camargo, de quando ele ainda trabalhava na MTV, com o Renato Russo, em 1993. Lembrei das críticas que já ouvi sobre as músicas da Legião Urbana, sobre as letras, mais precisamente. Sempre batem na mesma tecla: a música é depressiva. O que não percebem é que não dá pra ser feliz e conformado o tempo todo.

Claro que há músicas extremamente positivas na discografia da Legião, e eu até arrisco dizer que são a maioria. Mas alguns discos foram gravados em momentos problemáticos e expressavam de uma forma bastante realista o que acontecia com a sociedade. Renato achava, e ele diz isso nessa entrevista, que se só cantasse sobre coisas boas, seria muito irreal. Mas é isso que algumas pessoas fazem. Não perceber o que acontece com o mundo, ou pelo menos não ser afetado por isso, é brincar de viver no céu, fechar os olhos para o sofrimento e fazer de conta que está tudo bem.

E aí vêm a televisão e os jornais que insistem em banalizar toda essa violência, e nos acostumamos com crianças jogadas de prédios, com chacinas de meninos, com pais abusando de filhos, fome, miséria e destruição sem sentido. Tenho, então, a impressão de que o nosso senso de escândalo é medido em número de mortos ou em brutalidade. Só nós chama a atenção se é fora do comum, como 500 pessoas morrendo em um suicídio coletivo ou quando a filha decide matar os pais com a ajuda do namorado. E o pior, nossa medida aumenta: o que nos impressiona hoje, é banal amanhã, como se tivessemos essa sede pela tragédia nos coliseus particulares da nossa mentalidade doente.

Os séculos XIX e XX, enfim, deveriam ser os século de ouro para o mundo. Havia uma ansiedade para se saber se todos aqueles ideais que conquistamos com o iluminismo e com a revolução francesa teriam algum efeito. Era para vermos séculos de paz e de segurança, mas o que era nacionalismo romântico tornou-se em causa das aberrações que vimos em duas guerras mundias e mais de dois mil conflitos mortais que até agora vemos com naturalidade pelas lentes da CNN e do Jornal Nacional. Foi assim no XX e não se espera mais nada diferente no XXI.

Eu sei que também serei rotulado de pessimista. Sou pessimista se pessimismo for negar a insanidade da lucidez cega. A vida tem o que é belo aprendo a apreciá-lo. Mas não digam que por causa disso devo vendar os meus olhos.

Até bem pouco tempo atrás, poderíamos mudar o mundo. Quem roubou nossa coragem?" (R.M.J.)


*Termino com a melhor música escrita pelo Renato, na minha humilde e leiga opinião:
Para assistir a um vídeo com a música, clique aqui.

Perfeição
(Comp. Renato Manfredini Jr.)

Vamos celebrar a estupidez humana
A estupidez de todas as nações
O meu país e sua corja de assassinos
Covardes, estupradores e ladrões...

Vamos celebrar a estupidez do povo
Nossa polícia e televisão
Vamos celebrar nosso governo
E nosso estado que não é nação.

Celebrar a juventude sem escolas
As crianças mortas
Celebrar nossa desunião.

Vamos celebrar Eros e Tanatos
Persephone e Hades
Vamos celebrar nossa tristeza
Vamos celebrar nossa vaidade.

Vamos comemorar como idiotas
A cada fevereiro e feriado
Todos os mortos nas estradas
Os mortos por faltade hospitais.

Vamos celebrar nossa justiça
A ganância e a difamação
Vamos celebrar os preconceitos
O voto dos analfabetos
Comemorar a água podre
E todos os impostos
Queimadas, mentiras
E seqüestros.

Nosso castelo de cartas marcadas
O trabalho escravo
Nosso pequeno universo
Toda a hipocrisia e toda a afetação
Todo roubo e toda indiferença
Vamos celebrar epidemias
É a festa da torcida campeã.

Vamos celebrar a fome
Não ter a quem ouvir
Não se ter a quem amar
Vamos alimentar o que é maldade
Vamos machucar o coração.

Vamos celebrar nossa bandeira
Nosso passado de absurdos gloriosos
Tudo que é gratuito e feio
Tudo o que é normal
Vamos cantar juntos
O hino nacional
A lágrima é verdadeira
Vamos celebrar nossa saudade
Comemorar a nossa solidão.

Vamos festejar a inveja
A intolerância a incompreensão
Vamos festejar a violência
E esquecer a nossa gente
Que trabalhou honestamente
A vida inteira
E agora não tem mais
Direito a nada...

Vamos celebrar a aberração
De toda a nossa falta
De bom senso
Nosso descaso por educação
Vamos celebrar o horror
De tudo isto
Com festa, velório e caixão
Tá tudo morto e enterrado agora
Já que também podemos celebrar
A estupidez de quem cantou
Essa canção.

Venha!
Meu coração está com pressa
Quando a esperança está dispersa
Só a verdade me liberta
Chega de maldade e ilusão
Venha!
O amor tem sempre a porta aberta
E vem chegando a primavera
Nosso futuro recomeça
Venha!
Que o que vem é Perfeição!...

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Metalinguístico

Tentei escrever alguma coisa. Sem inspiração. Escrevi e apaguei dois textos. Talvez apague este também. Aliás, escrever é engraçado. Mas é desafiador. É instigante. É essa luta constante, travada na alma, para expressar sentimentos escondidos nos cantos do ser, lá no fundo, onde os poetas chamam âmago. Escrever provoca isso. Escrevo e fico nu. Minhas vergonhas, minhas glórias, desafetos, vitórias. A liberdade de rimar quando não pode, sobre assuntos banais, essas vontades do nada, todas triviais. Verdades que a ninguém importa, que a ninguém cativa, mas que não deixam de ser esse pedaço visceral que arranco de mim todos os dias e coloco à mostra, que causam afeto, nojo, raiva, pena, tudo misturado em de um caldeirão fervente e bebido em copos de novidade ou naquelas velhas xícaras da monotonia costumeira.
Não fique preocupado se em algum momento não entender nada do que escrevi. É proposital. A compreensão precisa ser encontrada além de onde chega o entendimento. Ou talvez nem exista compreensão e sejam só palavras vomitadas à mercê dos caprichos de uma mente inconstante que passa seus dias vagando à beira dos abismos da insanidade. Palavras fora do contexto, que viram pretexto para escrever, só escrever, como quem manda uma carta vazia.

E o que eu faço com esses sonhos?

Faxina de emoções?

- Achei uma caixa cheia de esperança aqui.
- Funciona?
- Acho que não. Parece quebrada.
- Jogue fora, então.
- Talvez se desse uma limpada...
- Jogue fora. Isso não deve valer muito.
- Mas...
- Tá vendo? É por isso que não gosto de fazer faxina com você. Sempre querendo guardar tudo.
- Já joguei. Sem estresse. E todo esse conhecimento que você tá arrumando aí?
- Não sei. Talvez sirva pra alguma coisa. Mas tem tanta coisa inútil aqui.
- Achei mais uma caixa. É grande. E tá cheia.
- Que tem aí dentro?
- Uhm... Quero ver. Um pouco de mágoa, Rancor, Algumas intolerâncias... Olha só! Aquela melancolia que eu tava procurando há tanto tempo. Parece que ainda me serve. O que eu faço com tudo isso?
- Guarda. Não dá pra perder isso aí. Mas guarda em um lugar fácil onde eu possa encontrar...
Coloca ali, perto da ganância e do egoísmo. Ali na estante...
- Pronto!
- Quase tudo arrumado.
- Só mais essa gaveta velha. O que eu faço com todos esses sonhos?
- Guarda. Quando acabar a caixa da da estante, talvez dê pra consertar.

Não tão belo quanto verdadeiro...


Não me fale de músicas,
De olhos verdes, de dúvidas.
Não me conte seus sonhos
Seus motivos, seus planos
seus pensamentos insanos.
Não são mais que lapsos
de passado e memória
de fatos, fotos, de história.
Não fale em viagens
Saudades,
paraísos e imagens
Já não lembro.
Não me fale de nós
Não lamente a ausência
Porque mesmo a sua voz
de tristeza e carência
faz renascer na essência
num coração tão ferido,
o pensamento perdido
de um amor tão atroz.

Não diga nada,
não fale de nós.

domingo, 24 de maio de 2009

Amor em três letras

Realidade romance,
dinâmica, destemperada.
Rudimentar. Ríspida.
Daquela dos desejos
amada.
Adoecida.

Rapidamente ruindo-se.
Desilusão da dor.
Restam reações raras
Dúvidas dormentes,
antecipadas,
alteradas.

Rosas revoltas.
despedaçadas de dúvida.
Reais? Raras. Recolhidas
de despedidas desculpadas.
Abnegadas
Absolvidas

Restam rancorosas
desilusões devidas.
Renascerá relutante.
Do desprezo devolvido,
abatida,
aliás, agradecida.

Memória, memórias, memória

Tenho refletido bastante sobre o que somos. Ainda mais, sobre o que faz sermos o que somos, o que nos diferencia. Não acredito em alma. Não acredito em espírito. Mas também não acredito só na animalidade do instinto. Acredito na memória. É ela que determina o que se faz e o que se diz. E talvez seja ela que nos faça parecidos com Deus.

Logo, de todas as doenças que me assustam, Alzhaimer é a pior. Não mata o corpo, faz padecer a personalidade, enquanto a consciência continua, uma morte lenta do que se já foi, torturante, agonizante, até um pouco exuberante, como que ironizando a própria vida.

Se pudesse mesmo ser clonado, com o cérero e tudo, ainda seria eu? Ou seria outro para o eu e eu para outros. É estranho pensar, é mesmo estranho que possamos ter consciência de que somos. É estranho ter consciência da própria consciência. É estranho e admirável. É assustador mas é até um pouco... afável. Cuide mais, então, de sua mente, esqueça seu corpo, não muito, nem por muito tempo, você ainda precisa dele. Mas guarde o que importa. Esqueça o que perturba.

Cultive o caráter, cultive a personalidade. Construa-se! A vida parece curta demais para aproveitar todas as possibilidades de crescer, de descobrir, de sentir, aproveite, então, algumas. A velhice é ilusória, é o fim, do corpo, mas enquanto houver memória, a vida continua lá, até que ela mesma desfaleça.

Covardia...

Era tarde, quase três de uma madrugada congelante. Congelante e enfadonha. O estudante, desgastado pelo cansaço, já fechava seus olhos meio que sem querer. As letras pareciam cada vez mais distantes, fugindo de onde as pudesse alcançar e os livros pesados em suas mãos tremulantes caiam espontaneamente sobre seu colo em intervalos de um estado letárgico entre o sono e a consciência.

Como que de imediato, viu-se em um lugar diferente. Vestia roupas estranhas. Paredes de pedras, frias, davam ao lugar um ar lúgubre. Um portão sombrio, mas que de tão curiosa cena era o mais misteriosamente convidativo. Logo descobriu que dava para um labirinto. Não era tão difícil, mas preocupou-se o novo herói e amarrou ao corpo um novelo de lã que desenrolava a cada passo caminhado na penumbra.

A história não era desconhecida. Enchia agora o peito com seu ar de Teseu destemido. Sentia aproximar-se uma respiração profunda e quente. As luzes de chamas que ardiam próximas ao monstro já podiam ser vistas aos poucos. Fogueiras de certo, muitas fogueiras, ou quem sabe uma só, uma que desse conta de esquentar uma abominação tão grande. O medo toma conta do que fora heroísmo. Tremores que começavam da ponta de seus pés, vestidos naqueles calçados estranhos, aliás, como eram mesmo estranhos, subiam até a última ponta de seus fios de cabelo, cabelos compridos, agora. Decide voltar. Enrolava o novelo mas o monstro parecia já perceber o intruso.

Corria a passos largos quando caiu. Os olhos fechados com a queda agora se abrem novamente sobre os livros. Era um sonho, sim, mas sabe-se lá por que o medo não passou. O alívio que desperto de outros pesadelos conhecera não vinha. Lembra-se do vestibular, tão logo. Precisa estudar. Volta-se aos livros e pensa: "Quem precisa de mais um Minotauro?". Pena não lhe terem dado o novelo.


A pressa de um novo ENEM

Estamos diante de uma revolução no Ensino Brasileiro, é fato. Só não sabemos se para melhor ou pior. O certo é que, pelo menos, é de se desconfiar do afoitismo do Ministério da Educação (MEC) e, diga-se de passagem, do Ministro Fernando Haddad, em colocar em prática o vestibular nacional unificado. Como já foi publicado em inúmeros jornais e revistas, coloco em questão alguns dos mesmos pontos sobre o novo ENEM.

Em primeiro lugar, a falta de planejamento. Não me parecem muito claros os objetivos do ministro. Dizem respeito somente à qualidade da educação brasileira? Por que a pressa em aplicar o novo modelo de provas? Ainda veremos as motivações reais do MEC, ou do próprio ministro. Motivações que não ficaram claras para ninguém até agora.

Um segundo ponto: é inquestionável que estudantes saindo de suas casas para morar fora de seu estado seja algo positivo. O ministro insiste em afirmar que menos de 1% dos atuais universitários brasileiros vivem essa realidade. Mas esse não é o problema. Está mais do que claro que é necessário e é positivo para o crescimento do país. O que preocupa é que o novo vestibular será mais um desafogador do Ensino no Sul-Sudeste do que um sistema de democratização do ensino. É utópico imaginar que estudantes de estados mais pobres por exemplo, tenham as mesmas condições de concorrer às mesmas vagas com estudantes de cursinhos renomados das capitais de estados mais ricos e que proporcionam melhores condições de ensino aos seus alunos. E logo, a infinidade de alunos muito melhor capacitados desses grandes centros, que mesmo tendo uma média superior à de alunos ingressantes de outros estados, ainda assim não conseguirem sua vaga na universidades mais conceituadas, vão se dispersar pelo pais.

Diz-se que tomarão as vagas dos alunos locais. Não concordo. As vagas são públicas, abertas a todos. Mas não há como esconder que essa massa de alunos prejudicados pela precariedade do ensino onde nasceram não terão as mesmas condições e oportunidades de concorrência, o que não parece muito justo à primeira vista. E tudo isso pode levar a uma cascata de alunos descendo para cursos menos concorridos e as elites de educação privada ocupando uma fatia ainda maior do que é ocupada com o método atual.

O nível dos alunos do Ensino Superior, é quase certo, melhorará tanto quanto a capacidade intelectual dos profissionais que serão formados. Mas volto a insistir, o governo precisa de um plano bem estabelecido para que o ensino seja nivelado, e nivelado por cima, e não por baixo, como se cogitou fazer reduzindo o nível das avaliações de ingresso.

Não são questões sem respostas. Algumas poucas articulações deixariam tudo mais claro. Concordo, talvez pela primeira vez, com o ministro Haddad. É, sim, necessário que se unifique o processo nacional de forma a estimular a qualidade no ensino nacional, mas a pressa e a falta de planejamento são dispensáveis nesse caso.

Pra início de conversa...

Nasce um novo Blog. E à 1h37min da manhã, seu primeiro post. A idéia agora é diferente. Quem já estava acostumado com meus textos sempre "monotemáticos e monótonos", agora pode esperar por algo um pouco diferente. O Devaneismo, que mantém esse nome estranho até que melhor seja encontrado, será uma miscelânia de assuntos. De política ao esporte. De ciência à religião. Nada que seja superoriginal, nem mesmo uma forma surpreendentemente inovadora de enxergar o mundo. É o mesmo autor, com as mesmas palavras e mas mesmas manias. Só mudam os assuntos. É uma coluna, enfim. Coluna de gente não famosa que escreve para ninguém. A coluna que me permite escapar um pouco da estagnação que é ser sempre o mesmo. Aliás, é exatamente a possibilidade de ser que eu não sou, ou de não ser quem eu sou, que motiva a escrever. Esperem, que coisas boas virão.