segunda-feira, 1 de junho de 2009

O grito


Passeava com dois amigos ao pôr-do-sol – o céu ficou de súbito vermelho-sangue – eu parei, exausto, e inclinei-me sobre a mureta– havia sangue e línguas de fogo sobre o azul escuro do fjord e sobre a cidade – os meus amigos continuaram, mas eu fiquei ali a tremer de ansiedade – e senti o grito infinito da Natureza.
(Edward Munch)


É assustador perceber que o desaparecimento do avião da Air France tenha causado tanta repercusão internacional. El país, Le monde, Folha de São Paulo, Washington Post, The Sun, amanhã todos terão estampados em suas primeiras páginas a tragédia da semana. Alguns até com encartes especiais sobre o possível acidente. Tudo isso enquanto a tira insignificante que noticia o seqüestro de 400 estudantes por militantes do Taliban no Paquistão, que se lê hoje, talvez já tenha desaparecido.

Também é assustador lembrar que os traços do nacionalismo romântico que nos levou ao pior século da humanidade permanecem vivos na sociedade e na cultura ocidentais. Milhões morrendo na África, atentados terroristas no Oriente Médio, atentados a mesquitas no Irã, homens bomba, mísseis em escolas da Caxemira e não é problema nosso O que é pior: quando lembramos que pessoas morrem na África, o conformismo-confortável leva a dizer que a África sempre foi assim. Mentira! Não é a África que é assim, é a nossa arrogância pútrida ocidental. Nosso ocidente-centrismo imundo, irracional que nos faz melhores do que os que morrem de fome. Mas quem mandou nasceram na África? Tanto país na Europa ou na América. Ainda mais trágico é aceitar as desculpas que damos. Não é problema nosso porque não devemos realmente pertencer a uma mesma espécie. Não somos mesmo iguais como se imaginava. Alguns são menos humanos.

Mas, sim, o desaparecimento do avião da Air France é triste. É um momento de drama para as famílias. Mas não digam que é para o país, ou para os países. Calem-se os governantes que se auto-promovem com a desgraça.

Talvez alguém faça sobre isso um sensacionalismo emotivo barato que nos faça derramar lágrimas falsas que usamos para nos enganar, fingindo sermos melhores e preocupados, condolentes, humanos. Do contrário nos contentamos em assistir pela curiosidade nefasta de contar os mortos, nossa sede de tragédias. Não de tragédias na África, nem no Paquistão, essas não nos incomodam mais, mas de ocidentais burgueses Euro-americanos.

3 comentários:

Denise disse...

Um soco na boca do estomago.........como nos enganamos e nos fazemos cegos não é?

afagos

Denise

Unknown disse...

Concordo com o que voce diz Dani, acho que somos tao egocentricos que nao nos importamos com aquilo que acontece a nossa volta, ou pior, fingimos nos importar. Esse pensamento de que cada um é por si precisa mudar. E enquanto isso no ocorrer, continuaremos a fingir que sentimos remorso pelo o que acontece a nossa volta.

Bruninha disse...

É triste ver que nos tornamos frios, insensíveis e acomodados. Ou sempre fomos assim??

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